A alimentação orgânica, balanceada e rica em nutrientes, é
buscada por um número cada vez maior de pessoas – o que poucas delas têm se
dado conta, até agora, é que esta necessidade pode ser suprida com o consumo de
plantas ainda inexploradas pelo paladar. Conhecidas como Pancs, as plantas
alimentícias não convencionais são facilmente encontradas na natureza e podem
trazer a biodiversidade de volta ao prato dos brasileiros. Abrangem desde
plantas nativas e pouco usuais até exóticas ou silvestres com uso alimentício
direto (na forma de fruto ou verdura) e indireto (amido, fécula ou óleo). Em
geral, não fazem parte do cardápio
diário da maior parte das pessoas e não costumam ser encontradas em
mercados convencionais. Elas não são transgênicas e, na maior parte dos casos,
são orgânicas.
Da Amazônia ao Rio Grande do Sul, as Pancs crescem
espontaneamente em qualquer ambiente. Sua alta resistência faz com que sejam
encontradas em quase todos os lugares, pois são nativas de cada região. No
mundo todo, a riqueza de plantas alimentícias foi estimada em 75 mil espécies
em 1991, pelos ambientalistas Kenton
Miller e Laura Tangley, autores do livro “Trees of Life: Saving Tropical
Forests and Their Biological Wealth”. Apesar de serem tão comuns, ainda são
poucos os que percebem sua função alimentar. O desconhecimento nos leva a
considerá-las como pragas e inços que descartamos, ignorando seu alto valor
nutritivo.
Nem sempre foi assim. Várias Pancs costumavam ser consumidas
por nossos avós ou bisavós. Sua eliminação do cardápio diário foi se dando
devido à pouca diversidade da agricultura convencional, que limita a dieta
contemporânea a poucas espécies, como o trigo e arroz, e também devido ao
afastamento do homem com o contato da natureza e da produção de seus alimentos.
A Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) estima que
o número de plantas consumidas pelo homem caiu de 10 mil para 170 nos últimos
cem anos, devido aos interesses comerciais da agroindústria.
No Brasil, a utilização dessas plantas voltou à tona com a
publicação, em 2014, do livro “Plantas Alimentícias Não Convencionais (Panc)”
no Brasil – Guia de identificação, aspectos nutricionais e receitas ilustradas”
de Valdely Kinupp e Harri Lorenzi. Na obra, estão catalogadas 351 espécies
consumidas no passado ou em alguma região do país e do mundo, com imagens para
facilitar sua identificação, além de informações sobre seu uso culinário e
receitas. O livro tem sido considerado o grande manual para um número crescente
de adeptos da alimentação orgânica e saudável.
Embora ainda distantes do cardápio da maioria dos
brasileiros, algumas Pancs já fazem parte de pratos da alta cozinha, por meio
das mãos de chefs como Alex Atala e Helena Rizzo. Considerado um dos melhores
restaurantes do mundo, o paulista Maní, de Helena Rizzo, oferece uma sobremesa
de mil folhas com creme de caule (rizoma) de lírio e sorbet de flores de
lírio-do-brejo. Este último ingrediente é o não-convencional: perfumado e
delicado, encantou a chef em 2014, quando ela o descobriu em uma incursão pela
mata no litoral norte de São Paulo.
Vegetais como o taiá, a vinagreira e a bertalha foram
substituídos, na alimentação dos brasileiros por espécies como a couve, a
rúcula e a alface. E o que é uma planta comestível pouco difundida em um lugar,
pode ser uma verdura tradicional em outra parte do mundo. Especialista em
cultura culinária e gastronômica, o sociólogo Carlos Alberto Dória explicou à
Revista da Cultura que a rúcula era considerada uma erva daninha até pouco
tempo atrás. E hoje, é uma de nossas saladas mais básicas. “Há uma fronteira
móvel entre cultura e biodiversidade”, afirmou Dória, explicando que, enquanto
já existem pessoas explorando os cogumelos
da Mata Atlântica, os supermercados brasileiros ainda só vendem os da Ásia e os
da Europa.
Além das plantas que jamais chegam à nossa cozinha, também
podemos considerar Pancs outras que são comuns, das quais fazemos uso apenas de
uma parte, sem levar em conta que outras também podem ser consumidas. É o caso
da bananeira, que, além do fruto, pode ter os mangarás (corações ou umbigo) e
os frutos aproveitados.
O desconhecimento sobre as Pancs priva o paladar de
experiências muitas vezes saborosas – e organismo, do acesso fácil a uma série
de nutrientes necessários para a manutenção da saúde. Isso porque muitas destas
plantas têm mais nutrientes (como o ferro) do que os convencionais.
Aproveitamos, então, para listar uma série delas. Fique atento: as Pancs podem
estar no seu quintal, em hortas, terrenos baldios e até nas calçadas da cidade.
8 Pancs
ORA-PRO-NÓBIS
Uma das mais conhecidas entre as não-convencionais, é
encontrada em abundância especialmente no Sudeste, mas está presente também em
outras regiões. Trepadeira, desenvolve-se em vários tipos de solo e de clima, é
de fácil cultivo e tem alto valor nutricional. É rica em vitaminas A, B e C,
fibras, fósforo e fósforo. As folhas são sua parte comestível, podendo ser
consumidas secas ou frescas, cruas ou cozidas, e até acrescentada a massas de
pães. Veja aqui uma receita com ora-pro-nóbis.
BERTALHA
Trepadeira com folhas e caules verdes, carnosos e
suculentos, tem aparência similar à do espinafre. É rica em vitamina A, além de
oferecer outros nutrientes como vitamina C, cálcio e ferro. As folhas e os
ramos novos devem ser consumidos logo após a colheita, refogados ou em
substituição ao espinafre e à couve, ou em omeletes, quiches e tortas. Crua,
pode ser ingerida junto a saladas verdes. Se preferir prepará-la em uma sopa,
deixe para acrescentá-la por último, pois a bertalha não deve ser cozida em
excesso.
SERRALHA
Para encontrá-la, preste atenção a locais perto de cercas e
de muros, em quintais e em terrenos baldios. A serralha é fonte de vitaminas A,
D e E. Desenvolve-se em quase todo o mundo pode servir de insumo para a
preparação de saladas e de receitas cozidas. Seu sabor é amargo e lembra o do
espinafre.
BELDROEGA
De crescimento espontâneo em muitas partes do mundo,
adapta-se a diversos tipos de clima, mas requer que o sol incida diretamente
sobre ela. Suas folhas e ramos podem ser consumidos crus, em saladas. Quando
cozidos, servem de ingrediente para pratos refogados e assados, além de sopas.
Suas sementes também podem ser ingeridas – a sugestão é acrescentá-las a uma
farinha de cereal depois de moídas. É rica em ácidos graxos ômega-3 e seu sabor
tende a variar de acordo com a forma de cultivo.
HIBISCO (OU VINAGREIRA)
Arbusto vigoroso, está entre as maiores fontes de ferro do
reino vegetal – possui quase o dobro que o espinafre. Tem como partes
comestíveis as folhas jovens e as pontas dos ramos – experimente e veja que o
sabor ácido justifica o seu nome. A flor e as sementes também podem ser
consumidas. Prepara-se a vinageira crua, refogada ou cozida. É uma planta que
gosta do clima quente e úmido e pode ser cultivada em todo o tipo de solo,
desde que bem drenado. Leia mais sobre ela aqui.
TAIOBA
Comestíveis e saborosas, as folhas desta planta já foram
bastante apreciadas na culinária mineira, mas acabaram sendo esquecidas ou
substituídas com o passar do tempo. Os motivos sobram para voltar a adotá-la
como fonte alimentícia, e não apenas para os mineiros. É rica em vitaminas A,
B, C e em minerais como cálcio e fósforo. A abundância de ferro faz com que a
sabedoria popular lhe atribua a cura da anemia. Uma dica é prepará-la refogada.
Por conter ácido oxálico, a planta crua pode causar irritação na boca. Mas,
atenção! Existem muitas plantas da família das Araceas, muito parecidas com a
taioba, porém não comestíveis. A planta
cresce melhor na sombra e em locais úmidos.
DENTE-DE-LEÃO
Essa planta cresce naturalmente em várias regiões do Brasil
(e do mundo inteiro) e há outros motivos para incluí-la na dieta: o
dente-de-leão selvagem tem sete vezes mais fitonutrientes do que o espinafre,
além de ser grande fonte de vitaminas A e C. Suas folhas podem dar origem a
pratos refogados e cozidos, além de saladas. O consumo também pode se estender
às flores. Algumas pessoas utilizam as raízes torradas e moídas como um
substituto ao café.
JACATUPÉ
Planta rústica e de cultivo simples, adapta-se facilmente a
diferentes regiões brasileiras e é conhecida, também, como feijão-batata.
Grande fonte de proteínas, chegou a ser comercializada em mercados, mas
desapareceu devido ao consumo de vegetais convencionais. As raízes são sua parte
comestível e podem ser preparadas cruas ou cozidas.
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alimentícias não convencionais. Basta escrever pancs ou o nome da planta no
campo de busca.
FONTE: